Campos dos Goytacazes, é marcada
pelo seu contexto sócio-histórico de construção das hierarquias sociais através
da utilização de mão-de-obra escrava, ora do índio – nativo das terras
colonizadas no séc. XVI – ora do negro, que por três séculos viveu sob regime
de escravidão – após ter sido retirado de diversas tribos africanas que tiveram
suas relações sociais de uma tribo para com a outra modificadas) –, e que teve
por consequência a segregação racial do negro.
Mesmo liberta após 13 de maio de 1888, a população negra
ainda sofre com as amarras sociais vividas e, que não legitimam os princípios de
democracia e cidadania hoje existentes, após Constituição de 1988. Isto é, a relação polarizada senhor-escravo –
presente inclusive em todas as relações sociais na forma de produção escravista
– permanece, embora refuncionalizada pelo novo contexto social. É importante
ressaltar que, além do regime de trabalho escravocrata marcou a cidade, nos
engenhos e nas grandes que usinas – gerando o chamado “ouro doce” a época –, em
todo Brasil teve entrada das teorias raciais advindas da Europa e que legitimaram
a idéia de superioridade do branco em detrimento do negro[1].
Assim, ainda nos dias
atuais a população negra reside em territórios mais carentes de políticas
públicas que assegurem os direitos sociais[2],
essenciais para o exercício da cidadania. Os jovens negros têm morrido
violentamente em maior quantidade que os jovens não negros, o que nos faz
perceber que a questão racial está intrisicamente ligada à violência letal do
Brasil. Os negros tem
renda inferior aos brancos, e este dado se agrava ainda mais no caso das
mulheres negras. Os tipos de ocupação da população negra no mercado de trabalho
são, em sua maioria, precarizadas e com pouco prestígio social, considerando
também que esta população possui índice de escolaridade inferior ao do não-negro
e este indicador dificultar o alcance certos cargos. Na educação, o tempo de
escola e a qualidade da educação da população negra são inferiores da população
não negra; o índice de analfabetismo e analfabetismo funcional também acometem
mais os negros; a média de anos de estudo é menor na população negra tal como
no ensino superior os dados subsiste.
Na
Secretaria Municipal da Família e Assistência Social, em 2012, foi criado o
Programa de Apoio a Igualdade Racial onde, o principal objetivo é combater os riscos
sociais que sobre eles incidam – considerando-os como violação de direitos –, e
Combater as vulnerabilidades[3] em
suas várias faces explícitas na sociedade campista, entre tantas estão: o
racismo em todos os níveis, o preconceito em todos sentidos e as demais formas
de intolerância; E inclusive, em âmbito
nacional a Secretaria Especializada em Políticas Públicas para Promoção da
Igualdade Racial (SEPPIR-PR) realizou diversas articulações com o Ministério de
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) na certeza de que a população que
sofre tais condições (e que tem raízes históricas) é a população negra. A
Política de Assistência Social, após Constituição de 1988 onde foi incluída no
tripé da Seguridade Social, e tem por função concretizar direitos sociais e
incluir as camadas mais vulneráveis da população com interesse na emancipação e
protagonismo de cada cidadão.
Em Campos dos Goytacazes, esta situação de vulnerabilidade
pode ser comprovada pelo cadastro único para programas sociais do governo
federal, onde a maioria dos inscritos são negros. Como os profissionais e/ou gestores
podem intervir na realidade dos munícipes garantindo o acesso a direitos se não
conhece a realidade na qual a maioria da população está imersa?
Embora, na atualidade, o
governo brasileiro tenha dado visibilidade à questão racial, com a implantação
das políticas afirmativas[4],
observa-se que a política de assistência social não tem acompanhado essa
conjuntura, uma vez que secundariza sua atenção a essa questão. Em Campos dos
Goytacazes/RJ, segunda cidade em densidade com maioria da população negra
(sendo superada apenas por Salvador/BA) o tema de Igualdade Sócio-racial é
negligenciado.
As políticas de promoção
da igualdade racial, de que tratamos aqui, devem ser vistas de forma
transversal pois promover a igualdade racial é um dever de todos, ou seja, ser
dada à questão a atenção específica em todas as políticas universais, a fazer
com que estas políticas e os direitos sociais inerentes a ela sejam
complementares. Na educação – conforme está alocada a antiga Fundação Zumbi dos
Palmares e atual Superintendência Municipal de Igualdade Racial – a atenção a
promoção da igualdade racial é necessária, entretanto, insuficiente se
realizada unicamente haja vista que, a implementação das leis 10.639/03 e
11.645/08 (não operacionalizada pela instituição) e, cursos[5]
oferecidos pela SMIR atende apenas uma das vertentes da vida do negro munícipe.
Já na saúde, há um atendimento específico a doença de anemia falciforme que
acomete a população negra.
Uma vez que, não há no
município a existência de uma Secretaria Municipal Especializada em Promoção da
Igualdade Racial, com a devida autonomia que lhe cabe, há a imensa necessidade
de uma equipe técnica voltada às questões raciais se fazer presente na política
de Direitos Humanos e assistência social por razões já explicitadas no corpo
deste texto. Promover a Igualdade Racial é reconhecer os Direitos Humanos e a
cidadania a que esta população específica carece.
Texto:
Gilberto Firmino Coutinho
Junior (totinho)
Manuelli Batista Ramos
[1] Atualmente,
séc. XXI, considera-se por população negra o conjunto de pessoas que se
autodeclaram pretas ou pardas, conforme o quesito cor ou raça usado pela
Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou que adotam
autodefinição análoga. (ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL, 2010, p. 8) e que são
51,1 % da população.
[2] Do
acesso a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a
assistência aos desamparados Contidos no Art 6º da Constituição Federal de 1988.
[3]
Como o descrito na Política Nacional da
Assistência Social (PNAS):
“um conjunto de pessoas em situação de risco, tal como
domicílio com infra estrutura inadequada, famílias com renda per capita
inferior a um quarto de salário mínimo, famílias com mulher como chefe, sem
companheiro, analfabeta e com filhos menores de 15 anos, famílias com pessoas
maiores de 16 anos desempregadas e com menos de quatro anos de estudo, famílias
com renda per capita menor que meio salário mínimo e pessoas com deficiência.”
[4] As políticas de ações
afirmativas são medidas especiais adotadas pelo Estado e pela iniciativa
privada para correção das desigualdades raciais e para a promoção da igualdade
de oportunidades (ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL, 2010, p. 9)
[5] Os
cursos oferecidos pela instituição SMIR são pré-vestibular e de idiomas (inglês
e espanhol), entretanto, como não possuem autonomia, inclusive financeira, os
cursos são constantemente interrompidos na sua execução, sendo dado apenas
atenção as manifestações carnavalescas da cidade. Vale ressaltar que os
critérios de adesão nos cursos oferecido por esta instituição não obedece aos
quesitos raciais.
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